21 abril 2011

Portaria n.º 4-A/2011

Tento, e por mais que tente não consigo fazer sentido da infame Portaria 4-A-2011, que mutila gravemente os fundos da Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, tendo-a já obrigado a reduzir as sessões diárias de 5 para 3 e forçado à não emissão do belíssimo depliant a que os cinéfilos lisboetas se habituaram. Por um lado, reconheço, num tempo de abismo tão grande como o que vivemos, a necessidade de um esforço partilhado, que terá forçosamente de passar também pela cultura. E depois entra a torrente de pensamento em sentido contrário: lembro-me do despesismo constante da administração central; dos gestores das empresas públicas com salários que dificilmente teriam no sector privado; de que a sub-orçamentação da cultura em Portugal é permanente e já de si limitadora quando a economia não está tão mal. Sobretudo, pela evidente função formadora da Cinemateca, pelo modo como um espectador bem preparado se torna mais lúcido e exigente de um ponto de vista de cidadania e penso que este corte de verbas exemplifica cabalmente a forma como esta crise (e todas as anteriores) está a ser tratada, procurando resolver de imediato sem olhar para a criação de um futuro. No fundo, é como Rui Tavares escreveu no Público: quando se quer perder peso, ou se faz o caminho mais longo da dieta e do exercício ou se opta pela solução rápida e se corta uma perna. O problema é que depois é difícil andar.

Fora isto, apenas mais dois pontos:

1) Para quem colocou, aquando da sua nomeação, a possibilidade de Maria João Seixas ser uma “girl” do PS, das duas uma: ou não o é e o corte das verbas prova-o, ou é e isso não adiantou nada. Pelo contrário, importa perguntar: será que influência política mais ampla e mais forte de João Bénard da Costa não teria sido útil nesta situação?

2) A referida portaria põe em causa o desenvolvimento do Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, que inclui o espólio da RTP, o mais completo do século XX português. E aqui, a utilidade política da decisão é óbvia. As imagens dos últimos 55 anos, controladas, amaciadas e normalizadas pelo ridículo que é a RTP Memória mostram-se assim menos propícias a demonstrar os caminhos, as causas e os responsáveis por Portugal se ter tornado nesta estrumeira à beira-mar plantada.

17 abril 2011

Novidades Petição

1) Depois de um primeiro podcast entre mim e o Luís Mendonça, surge agora um segundo, muito superior ao primeiro, entre o Luís, o Carlos Natálio e o Ricardo Lisboa. Oiçam!

Podcast Petição Cinema na RTP2 #2 from Luis Mendonca on Vimeo.




2) O Debate sobre a programação de cinema na RTP2, adiado devido a circunstâncias trágicas, foi remarcado para a 12 de Maio, pelas 18h00, no Auditório 2 da Universidade Nova de Lisboa. Marcarão presença os académicos João Mário Grilo e Francisco Rui Cádima, o provedor da RTP Paquete de Oliveira, o Luís e o Ricardo e... drumroll please... Jorge Wemans, director da RTP2. Apareçam!




All that country


Não sei, já esqueci, o que estava a fazer quando estreou A Prairie Home Companion (2006), mas tê-lo perdido em sala parece-me hoje, depois de uma visão cortesia do disco rígido da minha Meo Box, como uma das minhas maiores falhas na década transacta. O derradeiro filme de Robert Altman, estreado poucos meses antes da morte do cineasta, é o seu grande testamento cinematográfico, um olhar sobre o fim de um mundo e de um tempo e um exemplo cabal do seu modo idiossincrático e coral de filmar.

A Prairie Home Companion é o título de um programa radiofónico que, aos sábados à noite, ainda mete poucas centenas de pessoas num teatro de uma pequena cidade do Minnesota para meia-dúzia de canções country hardcore (nem os comercialismos à Garth Brooks nem o alt de Bright Eyes ou Ryan Adams). Acontece que o teatro foi adquirido por uma multinacional que o planeia demolir para construir um parque de estacionamento. O que seguimos, durante a perfeição que é este filme, é o último espectáculo e que corresponde ao início de uma era de incerteza na melhor das hipóteses, talvez até de apagamento para aqueles artistas, na melhor das hipóteses condenados a seguir o circuito das pequenas feiras em direcção ao esquecimento final. O filme, escrito pelo radialista Garrison Kellor, que se interpreta a si mesmo, intercala os bastidores de que fala o título português com números musicais, interpretados brilhantemente pelo inspiradíssimo casting (as irmãs Meryl Streep e Lily Tomlin são pouco menos que geniais e o duo Woody Harrelson e John C. Reilly pouco fica atrás) e o elenco coral, como habitualmente em Altman (aos actores já referidos juntam-se Kevin Kline, Tommy Lee Jones, Lindsay Lohan e uma esplendorosa Virginia Madsen, anjo da morte a lembrar a Jessica Lange do All That Jazz de Bob Fosse), não lhes fica atrás. Numa carreira em que, entre o genial Shortcuts (1993) e Gosford Park (2002), pouco de interessante houve, A Prairie Home Companion faz, de pleno direito, figura de obra cimeira.

Se assim é, é porque Altman, puxando dos galões do seu virtuosismo (vejamos o início, travelling sobre Kevin Kline a sair de um “diner”num ambiente misto de “film noir” com a América profunda de Tom Waits), e através do método comum nos últimos anos da sua carreira, o mosaico de personagens num mesmo contexto, aproveita o argumento de Kellor para a derradeira encenação: a do seu próprio fim, enquanto pessoa e enquanto cineasta. Voltando a motivos comuns na sua obra (lembremos Nashville, também ambientado no meio do country), Altman junta ao filme uma camada de nostalgia pelo fim próximo de um tempo (vejamos o chiaroscuro constante e a profusão de dourados na fotografia) e malsão pelo medo do futuro. Não sendo um filme assustado com o que aí vem, é um filme com plena consciência do fim que representa – para as personagens, para o cineasta (que o filmou aos 81 anos) e até para o tempo de um certo cinema (não poderá ser feita uma analogia entre este tipo de country e o cinema norte-americano dos anos 70 de que Altman foi nome cimeiro)?

É sempre arriscado perguntar se Altman estaria ciente da proximidade da sua própria morte (embora, quando se atingem certas idades respeitáveis, esta seja sempre uma sombra) e se a encenação que faz dela é consciente. Porém, uma certeza é possível avançar: A Prairie Home Companion bate-se de igual (podendo até perder, mas lutando até ao fim) com filmes de igual função como o já citado All That Jazz (1979) de Bob Fosse ou o Morte em Veneza (1971) de Luchino Visconti. Se isto não é elogio, então não sei o que será…

09 abril 2011

Sidney Lumet RIP

Correcção

O debate sobre a situação do cinema na RTP2, agendado para a passada terça-feira e que não se realizou devido à morte de um aluno, foi adiado não para a próxima terça-feira, mas para data a marcar em breve. Obrigado.