No inter-rail em que se transformou a carreira de Woody Allen nos últimos anos, a primeira paragem é sempre a melhor: veja-se o exemplo de Inglaterra, onde Cassandra’s Dream e You Will Meet a Tall Dark Stranger não conseguiram acompanhar o nível de Match Point; e especule-se sobre se, voltando à Catalunha, Allen conseguiria replicar os resultados amplamente positivos de Vicky Cristina Barcelona. Chegados a Paris, aproveitando todo o charme e toda a história da cidade, Allen opta por uma comédia romântica esdrúxula, nostálgica e apostada em encantar o espectador. Consegue-o. Mesmo não sendo uma obra-prima, Midnight in Paris é um dos mais agradáveis filmes de Woody Allen em décadas e um onde, contaminado talvez pela cidade-luz, se mostra mais optimista e menos cínico do que alguma vez me lembro de o ver.
E isso é visível desde logo na escolha de Owen Wilson para alter-ego de Allen, muito longe, por exemplo, do cinismo destrutivo de Kenneth Brennagh em Celebrity. Em Paris numa viagem que antecede o seu casamento com a materialista e acelerada Inez (Rachel McAdams de tom correcto), com a qual é, desde o início do filme, vincadamente incompatível, o escritor Gil Pearson, angustiado pela incapacidade de passar de argumentista sensaboração de Hollywood para escritor de pleno direito, começa a passear à noite por Paris, até lhe ser dada uma boleia, num Peugeout antigo, por nada menos que F. Scott e Zenda Fitgerald. O percurso que acompanhamos, num filme que, como muitos Allen, parece ser cronometrado para não ultrapassar a hora e meia, é o de uma descoberta e um espanto quase infantis de todas as figuras que perfazem o modernismo parisiense, desde Ernest Hemingway e Gertrud Stein a Buñuel e Dali, todos caricaturados de acordo com as suas personas históricas (Fitzgerald mortificado pelo seu amor por Zelda, Hemingway sempre lapidar e másculo, Stein matriarcal e pragmática). Aí, nesse mundo que Allen retrata através de tons dourados e quentes e sem nunca o definir liminarmente como imaginação ou sonho, por entre uma Marillon Cottillard luminosa e uma Carla Bruni meramente decorativa, Pearson, que via os anos 20 parisienses como uma era dourada, descobre que os seus habitantes também viam noutras épocas aquilo que a sua não possuía. O que o futuro escritor percebe é que se o passado permite chegar a um presente e melhorá-lo pela experiência e pela memória, permitindo assim o futuro, é que também há um caminho no momento presente para ser traçado e aspectos positivos a descobrir. Não há, então, “épocas douradas”, todas as épocas terão as suas vantagens para quem as quer descobrir. A nostalgia é agradável mas não deve ser impeditiva.
Será que podemos ver aqui um explanar da posição de Allen numa altura em que a sua carreia, do ponto de vista crítico e popular, já viu melhores dias? Creio que sim. Midnight in Paris é um bom Allen, uma auto-afirmação de vitalidade de um cineasta dado como preso na rotina do extertor final da sua carreira e que parece aparecer aqui mais leve, mais despreocupado e até mais sedutor do que ultimamente. Veremos se consegue, caso haja uma segunda obra em Paris (ou no próximo filme, que terá lugar em Roma), manter o bem que lhe fez a mudança de ares.
E isso é visível desde logo na escolha de Owen Wilson para alter-ego de Allen, muito longe, por exemplo, do cinismo destrutivo de Kenneth Brennagh em Celebrity. Em Paris numa viagem que antecede o seu casamento com a materialista e acelerada Inez (Rachel McAdams de tom correcto), com a qual é, desde o início do filme, vincadamente incompatível, o escritor Gil Pearson, angustiado pela incapacidade de passar de argumentista sensaboração de Hollywood para escritor de pleno direito, começa a passear à noite por Paris, até lhe ser dada uma boleia, num Peugeout antigo, por nada menos que F. Scott e Zenda Fitgerald. O percurso que acompanhamos, num filme que, como muitos Allen, parece ser cronometrado para não ultrapassar a hora e meia, é o de uma descoberta e um espanto quase infantis de todas as figuras que perfazem o modernismo parisiense, desde Ernest Hemingway e Gertrud Stein a Buñuel e Dali, todos caricaturados de acordo com as suas personas históricas (Fitzgerald mortificado pelo seu amor por Zelda, Hemingway sempre lapidar e másculo, Stein matriarcal e pragmática). Aí, nesse mundo que Allen retrata através de tons dourados e quentes e sem nunca o definir liminarmente como imaginação ou sonho, por entre uma Marillon Cottillard luminosa e uma Carla Bruni meramente decorativa, Pearson, que via os anos 20 parisienses como uma era dourada, descobre que os seus habitantes também viam noutras épocas aquilo que a sua não possuía. O que o futuro escritor percebe é que se o passado permite chegar a um presente e melhorá-lo pela experiência e pela memória, permitindo assim o futuro, é que também há um caminho no momento presente para ser traçado e aspectos positivos a descobrir. Não há, então, “épocas douradas”, todas as épocas terão as suas vantagens para quem as quer descobrir. A nostalgia é agradável mas não deve ser impeditiva.
Será que podemos ver aqui um explanar da posição de Allen numa altura em que a sua carreia, do ponto de vista crítico e popular, já viu melhores dias? Creio que sim. Midnight in Paris é um bom Allen, uma auto-afirmação de vitalidade de um cineasta dado como preso na rotina do extertor final da sua carreira e que parece aparecer aqui mais leve, mais despreocupado e até mais sedutor do que ultimamente. Veremos se consegue, caso haja uma segunda obra em Paris (ou no próximo filme, que terá lugar em Roma), manter o bem que lhe fez a mudança de ares.