21 maio 2009

No dia da morte de J.B.C.

Ao sair do emprego, junto às Amoreiras e com destino à Avenida da Liberdade, soube logo que teria de passar pela Cinemateca. Amoreiras em direcção ao Rato, Rato à direita pela rua da Escola Politécnica, na Politécnica vira-se à esquerda, passa-se pelo Altis e entra-se na Barata Salgueiro. Junto ao hotel e olhando ainda de longe para a Cinemateca, reparo no facto de o portão estar fechado. E penso imediatamente no facto de, por não passar pela zona em domingos, feriados ou quejandos, ser aquela a primeira vez que o vejo encerrado. De forma cadenciada, pessoas abrem o portão e transportam materiais para a carrinha estacionada junto ao passeio. Sente-se à distância o peso do luto, como uma série de rumores que perpassam aquele palacete viscontiano.

Dirijo-me à janela onde normalmente se encontra afixada a programação e vejo apenas um mero aviso de nojo, de interrupção das sessões normais e da passagem de Johnny Guitar, amanhã, às 21h30m, com entrada livre.

Viro as costas e sigo o meu caminho, levando mais um cigarro à boca e incandescendo-lhe a extremidade. A única coisa que me passava pela cabeça eram as falas finais de King Lear:
"The oldest hath borne most: we that are young,
shall never see so much nor live so long."

1 comentário:

Ricardo disse...

Não sei se irei à sessão de amanhã do Johnny Guitar. Se fosse seria num espírito de ver quem iria lá, os tipos de público, ou uma ou outra cara conhecida.

Para dizer a verdade, quero evitar passar por lá ou falar com alguém de lá. Pelo que me contas, e pela foto que tiraste, parece haver toda uma atmosfera funérea no ar, que eu não aprecio de todo. Prefiro lembrar o João Bénard de final dos anos 90, quando no seu programa na RTP 2 "No Meu Cinema" me fez descobrir o cinema de Hitchcock e ver o meu primeiro Lang. Quero lembrar o João Bénard avô respeitado do Cinema, mestre da programação cinéfila, a apresentar as sessões na Cinemateca com aquela extraordinária voz dele, e lembrar a sua escrita, alguns dos melhores textos que me lembro de ter lido a nível mundial sobre Hitchcock, Nicholas Ray ou Mizoguchi.

Quero lembrar esse João Bénard, e não o João Bénard burocrático dos corredores da Cinemateca e das decisões, o rei absoluto egocêntrico que muitas vezes o acusam (algo exageradamente) de ter sido. Como disse o Outro: "Quem nunca pecou, que atire a primeira pedra".

Farewell, sweet prince. Sentiremos a tua falta. Vemo-nos lá em cima...