Na sua pequena mas essencial participação em The Limits of Control, o novo filme de Jim Jarmusch, Tilda Swinton diz que “os melhores filmes são como sonhos que não temos a certeza de ter tido”. Continuando a citar de memória, Swinton afirma igualmente que “nalguns dos melhores, as pessoas passam o tempo sem fazer nada ou sentadas a falar”. E dá o exemplo de The Lady from Shanghai (Orson Welles, 1947), apelidando-o de “total confusão”. Já antes, uma personagem havia dito ao Lone Man de Isaach de Bankolé: “A realidade é arbitrária”. A bem dizer, são estes os dois momentos de mise en abyme que podemos pegar no filme. Porque este realmente parece um sonho, inteiramente arbitrário e completamente cinematográfico, um filme de descodificação perto do impossível mas infinitamente recompensador.
Estruturado como um sonho ou como um minimalista poema visual, o que se pode dizer de mais imediato é que há alguns paralelos com o seu Ghost Dog (1999). Filme sobre um assassino profissional e a multiplicidade de personagens com quem troca caixas de fósforos e a ocasional palavra, em cenas glosadas a partir de um inicio idêntico, trabalha e estilhaça os códigos do filme de gangsters e do filme acerca de viagens, num todo existencialista, fragmentado e de um formalismo simultaneamente asfixiante de tão radical e do mais estimulante que temos visto. A sua visão é, no fundo, tão frustrante quanto a escrita de um parágrafo quanto este: arranha-se o que se quer pensar e o que se quer dizer, mas fica-se sempre na superfície. Porque The Limits of Control é um filme de múltiplas superfícies, num mosaico repetitivo onde é discutível que haja uma parede de significado a tapar, mas onde os olhos e a mente se perdem em busca de algo, quanto mais não seja de um dos muitos motivos de fascínio visual e onírico aqui presentes.
Em última instância, os limites do controlo aqui enumerados são também os nossos limites em agarrar uma obra através de um qualquer significado linguístico, imagético ou até ontológico. Não por acaso, tudo tem sido aqui visto, desde a mimése de Dick Cheney na personagem de Bill Murray à ideia da arte como linguagem codificada nos quadros que Bankolé vê no Reina Sofia, à citação da área meta-cinematográfica do filme de gangsters de Point Blank (John Boorman, 1967) ou Le Samourai (Jean-Pierre Melville, 1967), passando pela influência dos planos de Pedro Costa (ideia que não me custa nada a acreditar) ou pelo orientalismo difuso que coloca o Lone Man constantemente a fazer tai-chi. Tudo estará correcto e tudo será insuficiente para o definir. Porque The Limits of Control é um excelente exemplo do melhor tipo de diletância: aquela que demonstra a mais profunda liberdade física e mental. Parafraseando Tilda Swinton, é um filme que não temos a certeza de ter visto. E ainda bem.
Estruturado como um sonho ou como um minimalista poema visual, o que se pode dizer de mais imediato é que há alguns paralelos com o seu Ghost Dog (1999). Filme sobre um assassino profissional e a multiplicidade de personagens com quem troca caixas de fósforos e a ocasional palavra, em cenas glosadas a partir de um inicio idêntico, trabalha e estilhaça os códigos do filme de gangsters e do filme acerca de viagens, num todo existencialista, fragmentado e de um formalismo simultaneamente asfixiante de tão radical e do mais estimulante que temos visto. A sua visão é, no fundo, tão frustrante quanto a escrita de um parágrafo quanto este: arranha-se o que se quer pensar e o que se quer dizer, mas fica-se sempre na superfície. Porque The Limits of Control é um filme de múltiplas superfícies, num mosaico repetitivo onde é discutível que haja uma parede de significado a tapar, mas onde os olhos e a mente se perdem em busca de algo, quanto mais não seja de um dos muitos motivos de fascínio visual e onírico aqui presentes.
Em última instância, os limites do controlo aqui enumerados são também os nossos limites em agarrar uma obra através de um qualquer significado linguístico, imagético ou até ontológico. Não por acaso, tudo tem sido aqui visto, desde a mimése de Dick Cheney na personagem de Bill Murray à ideia da arte como linguagem codificada nos quadros que Bankolé vê no Reina Sofia, à citação da área meta-cinematográfica do filme de gangsters de Point Blank (John Boorman, 1967) ou Le Samourai (Jean-Pierre Melville, 1967), passando pela influência dos planos de Pedro Costa (ideia que não me custa nada a acreditar) ou pelo orientalismo difuso que coloca o Lone Man constantemente a fazer tai-chi. Tudo estará correcto e tudo será insuficiente para o definir. Porque The Limits of Control é um excelente exemplo do melhor tipo de diletância: aquela que demonstra a mais profunda liberdade física e mental. Parafraseando Tilda Swinton, é um filme que não temos a certeza de ter visto. E ainda bem.
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