(...)não tenho os conhecimentos do João Bénard. Terei um pequeno grão da mesma paixão.
Então porque aceitou o cargo, cara Maria João Seixas?
De resto, deleguei a programação no dr. Pedro Mexia. Perguntei-lhe quais as áreas que ele gostaria que lhe fossem delegadas e ele escolheu as duas que eu mais gostaria para mim [risos]: programação e ANIM. Embora me tivesse ficado uma outra de que nunca abro mão, que é a do pessoal.
Traduzindo: não sou bem directora, sou mais uma técnica de recursos humanos…
Tenho pena que se sintam guerreados pela casa, acho que essa não era intenção do dr. Bénard da Costa. (…) Mas não é por uma questão diplomática que o faço. Acho mesmo que por alguma razão se afastaram alguns cineastas desta casa e eu gostaria de conseguir reaproximá-los para eles perceberem que de facto esta casa é deles. Só que o ser deles implica uma parceira, não é propriamente à maneira que eles querem, tem de ser da maneira que melhor encontrarmos para servir as duas partes.
Cara Maria João Seixas, pago-lhe um café no Starbucks se conseguir ser ainda mais vaga do que isto.
Gostaria de reforçar o orçamento para os trabalhos de restauro do ANIM.
Até que enfim, um projecto para o futuro. E esta deve ser uma área prioritária para a Cinemateca. Afinal de contas, da RTP Memória estamos todos fartos.
(…) montar uma rede fiável de equipamento de projecção digital e contribuir com o acervo da Cinemateca para a circulação de filmes e para dar a ver com regularidade cinema de qualidade a quem se está a formar neste momento na Net. (…) Gostaria que esse trabalho pudesse ser feito até à ilha do Pico.
Primeiro ponto, não há nada de mal em um cinéfilo usar a net como meio de formação. Segundo ponto, eu também gosto muito de ficção científica, sobretudo numa altura em que, tarde ou cedo, seremos governados pelo ultra-neo-liberal dr. Passos Coelho e pelas sempre culturalmente atentas pessoas do PSD – lembram-se do grande secretário de Estado da Cultura que foi Santana Lopes?
Do meu ponto de vista, isso reforça a obrigação estatutária de qualquer cinemateca de insistir na história do cinema, nos clássicos, aqueles que já ninguém vai ver, ou que podem ver em DVD os mais interessados, aqueles aonde ainda existe uma cinefilia que a minha geração reconhece como tal.
Aqui, fico contente.
Em Portugal, ao contrário de muitos países europeus, não temos uma lei que era essencial para enriquecermos o nosso acervo, que é uma lei de depósito legal que obrigasse os distribuidores comerciais a depositarem. Os outros países têm acervos fantásticos, podem variar. Nós temos de comprar, e comprar é muito caro. Há distribuidoras que, quando lhes apetece e se lhes apetece, depositam uma cópia, mas isso não é feito sistematicamente.
Uma falha gritante. Se a sra. Ministra é assim tão apaixonada pela causa do cinema e se temos uma deputada-actriz na Assembleia da República, era uma boa altura para acabar com este problema.
O Partido Socialista é a família política com que me identifico. Não sou militante, mas se me perguntarem o que é que eu sou ideologicamente, direi que faço parte do Partido Socialista. Sinto-me bem com essa pertença mas nunca fui próxima do Partido Socialista. E a nomeação que eu tive, que também me surpreendeu na altura, foi quando o eng.º António Guterres me convidou para a assessoria cultural do seu gabinete. Os únicos lugares que eu tinha tido decorriam das minhas relações com um dos capitães de Abril - o meu capitão de Abril -, o major Vítor Alves. Com a eng.ª Maria de Lourdes Pintasilgo, trabalhei na Comissão da Condição Feminina e depois, quando ela foi primeira-ministra, não trabalhei com ela. Depois, tive intervenções nas campanhas presidenciais do dr. Jorge Sampaio, do dr. Mário Soares e do prof. Manuel Maria Carrilho quando se candidatou à presidência da Câmara Municipal de Lisboa. Tudo isso fiz sem ter nenhuma relação directa com o partido. A minha participação nas campanhas não trazia nenhum isco na ponta, isto é, eu não estava à espera de ser compensada com nada.
Este segmento da conversa deixa-me sentimentos mistos. Por um lado, o que há mais é gente diz não estar envolvida com ninguém mas que aparece em todo o lado e o facto de não ter cartão de militante não muda em nada uma ligação política que a própria Maria João Seixas assume. Por outro, as pessoas têm direito à sua filiação e a ser julgadas pelo seu trabalho e não pelas suas ideias políticas. Porém, permanece a pergunta: o cargo de director da Cinemateca passou a ser um cargo político? Se assim for, estamos mal.
BALANÇO: Há boas ideias de futuro para a Cinemateca, mas são poucas. Outras são francamente negativas (quem criticou as escolhas de ciclos de João Bénard da Costa não poderá ficar contente com o ciclo Os Filmes dos Presidentes) e outras ainda francamente indiferentes (perante a necessidade de mostrar obras completas de cineastas como António Reis, António Macedo ou António Campos, o ciclo de grandes sucessos do cinema português acompanhado por debates é igual ao litro). Sobretudo, parece-me que será um momento de navegação à vista, não apenas devido à crise mas também porque falta uma ideia clara, discernível, do que a directora quer para o espaço. Assim, este primeiro mandato de Maria João Seixas no cargo parece ser um espaço intermédio, onde se lançam pedras para o futuro mas onde ainda se vive uma certa indecisão pós-Bénard. Uma coisa parece certa: com Maria João Seixas a Cinemateca não será um espaço de militância total e quererá agradar a gregos e a troianos. E aqui voltamos ao problema central da entrevista: como isto será feito não se percebe muito bem. Teremos de esperar para ver.
(Sobre a questão da Cinemateca do Porto escreverei um post isolado, se tudo correr bem)
Então porque aceitou o cargo, cara Maria João Seixas?
De resto, deleguei a programação no dr. Pedro Mexia. Perguntei-lhe quais as áreas que ele gostaria que lhe fossem delegadas e ele escolheu as duas que eu mais gostaria para mim [risos]: programação e ANIM. Embora me tivesse ficado uma outra de que nunca abro mão, que é a do pessoal.
Traduzindo: não sou bem directora, sou mais uma técnica de recursos humanos…
Tenho pena que se sintam guerreados pela casa, acho que essa não era intenção do dr. Bénard da Costa. (…) Mas não é por uma questão diplomática que o faço. Acho mesmo que por alguma razão se afastaram alguns cineastas desta casa e eu gostaria de conseguir reaproximá-los para eles perceberem que de facto esta casa é deles. Só que o ser deles implica uma parceira, não é propriamente à maneira que eles querem, tem de ser da maneira que melhor encontrarmos para servir as duas partes.
Cara Maria João Seixas, pago-lhe um café no Starbucks se conseguir ser ainda mais vaga do que isto.
Gostaria de reforçar o orçamento para os trabalhos de restauro do ANIM.
Até que enfim, um projecto para o futuro. E esta deve ser uma área prioritária para a Cinemateca. Afinal de contas, da RTP Memória estamos todos fartos.
(…) montar uma rede fiável de equipamento de projecção digital e contribuir com o acervo da Cinemateca para a circulação de filmes e para dar a ver com regularidade cinema de qualidade a quem se está a formar neste momento na Net. (…) Gostaria que esse trabalho pudesse ser feito até à ilha do Pico.
Primeiro ponto, não há nada de mal em um cinéfilo usar a net como meio de formação. Segundo ponto, eu também gosto muito de ficção científica, sobretudo numa altura em que, tarde ou cedo, seremos governados pelo ultra-neo-liberal dr. Passos Coelho e pelas sempre culturalmente atentas pessoas do PSD – lembram-se do grande secretário de Estado da Cultura que foi Santana Lopes?
Do meu ponto de vista, isso reforça a obrigação estatutária de qualquer cinemateca de insistir na história do cinema, nos clássicos, aqueles que já ninguém vai ver, ou que podem ver em DVD os mais interessados, aqueles aonde ainda existe uma cinefilia que a minha geração reconhece como tal.
Aqui, fico contente.
Em Portugal, ao contrário de muitos países europeus, não temos uma lei que era essencial para enriquecermos o nosso acervo, que é uma lei de depósito legal que obrigasse os distribuidores comerciais a depositarem. Os outros países têm acervos fantásticos, podem variar. Nós temos de comprar, e comprar é muito caro. Há distribuidoras que, quando lhes apetece e se lhes apetece, depositam uma cópia, mas isso não é feito sistematicamente.
Uma falha gritante. Se a sra. Ministra é assim tão apaixonada pela causa do cinema e se temos uma deputada-actriz na Assembleia da República, era uma boa altura para acabar com este problema.
O Partido Socialista é a família política com que me identifico. Não sou militante, mas se me perguntarem o que é que eu sou ideologicamente, direi que faço parte do Partido Socialista. Sinto-me bem com essa pertença mas nunca fui próxima do Partido Socialista. E a nomeação que eu tive, que também me surpreendeu na altura, foi quando o eng.º António Guterres me convidou para a assessoria cultural do seu gabinete. Os únicos lugares que eu tinha tido decorriam das minhas relações com um dos capitães de Abril - o meu capitão de Abril -, o major Vítor Alves. Com a eng.ª Maria de Lourdes Pintasilgo, trabalhei na Comissão da Condição Feminina e depois, quando ela foi primeira-ministra, não trabalhei com ela. Depois, tive intervenções nas campanhas presidenciais do dr. Jorge Sampaio, do dr. Mário Soares e do prof. Manuel Maria Carrilho quando se candidatou à presidência da Câmara Municipal de Lisboa. Tudo isso fiz sem ter nenhuma relação directa com o partido. A minha participação nas campanhas não trazia nenhum isco na ponta, isto é, eu não estava à espera de ser compensada com nada.
Este segmento da conversa deixa-me sentimentos mistos. Por um lado, o que há mais é gente diz não estar envolvida com ninguém mas que aparece em todo o lado e o facto de não ter cartão de militante não muda em nada uma ligação política que a própria Maria João Seixas assume. Por outro, as pessoas têm direito à sua filiação e a ser julgadas pelo seu trabalho e não pelas suas ideias políticas. Porém, permanece a pergunta: o cargo de director da Cinemateca passou a ser um cargo político? Se assim for, estamos mal.
BALANÇO: Há boas ideias de futuro para a Cinemateca, mas são poucas. Outras são francamente negativas (quem criticou as escolhas de ciclos de João Bénard da Costa não poderá ficar contente com o ciclo Os Filmes dos Presidentes) e outras ainda francamente indiferentes (perante a necessidade de mostrar obras completas de cineastas como António Reis, António Macedo ou António Campos, o ciclo de grandes sucessos do cinema português acompanhado por debates é igual ao litro). Sobretudo, parece-me que será um momento de navegação à vista, não apenas devido à crise mas também porque falta uma ideia clara, discernível, do que a directora quer para o espaço. Assim, este primeiro mandato de Maria João Seixas no cargo parece ser um espaço intermédio, onde se lançam pedras para o futuro mas onde ainda se vive uma certa indecisão pós-Bénard. Uma coisa parece certa: com Maria João Seixas a Cinemateca não será um espaço de militância total e quererá agradar a gregos e a troianos. E aqui voltamos ao problema central da entrevista: como isto será feito não se percebe muito bem. Teremos de esperar para ver.
(Sobre a questão da Cinemateca do Porto escreverei um post isolado, se tudo correr bem)
4 comentários:
Para mim o que é assustador é a questão da Cinemateca do Porto. Mostra completa ignorância sobre o panorama cultural da cidade e sobre a quantidade de público alvo, além de não fundamentar realmente a opinião.
A seu tempo lá irei.
...mas existe Directora na Cinemateca? Desde que JBC desapareceu, nunca mais lá fui. O pseudo poeta-crítico faz alguma coisa lá?
Aprendam com França e ponham um cineasta a presidir.
Só comento o teu comentário, Hugo, por te conhecer. Tens que reconhecer: se não vais à Cinemateca, não é por já não ser JBC o presidente. Não é pela programação, que se não continua o mesmo rumo, está melhor pela ligeira deambulação fora da "história do cinema".
Isto não é nenhuma defesa da actual presidente (a entrevista, aliás, preocupa), mas tu és capaz de melhor e mais coerente. E a ver se te picas e sais do casulo.
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