03 maio 2011

O fim do Medeia Residence


Declaração de interesses: sou subscritor do Medeia Card e frequentador assíduo dos cinemas Medeia Monumental e Residence. Actualmente, prefiro-os aos do King, por lá se poder almoçar ou tomar um café num espaço arejado e povoado antes da sessão e ao Fonte Nova pela maior qualidade das salas. Porém, há defeitos inegáveis no espaço, quer no do Saldanha quer no da Fontes Pereira de Melo: lavabos que deixam a desejar, cadeiras desconfortáveis e, no Residence, a irritante vibração causada pelo regular passar do metro na linha amarela. Mas, apesar de tudo, foi lá que vi 80% dos filmes que visionei em sala nos últimos 5 anos. É, por isso, com algum pesar que recebi a notícia de que as quatro salas do Saldanha Residence serão encerradas na próxima 2ª Feira, 09 de Maio.

Por outro lado, não sei até que ponto posso dizer que estou surpreendido. Porque qualquer pessoa que vá a estes cinemas sabe que o ambiente neles vivido nos últimos tempos é absolutamente deprimente. Ainda no passado sábado, esperando pela sessão das 16h de The Source Code, estive dez minutos sozinho com a minha companheira no átrio antes de aparecer qualquer outro espectador. A exibição cinematográfica em Lisboa encontra-se no maior marasmo (os únicos eventos vibrantes e enérgicos são os festivais) e, quer pela difícil situação financeira do país quer, no caso dos cinemas Medeia, por escolhas de exibição discutíveis. É inacreditável que Paulo Branco se queixe (embora com razão) do domínio exagerado dos cinemas do “amigo Joaquim” na mesma semana em que a sala 4 do Monumental se encontra ocupada pelo filme Thor. Branco deixou-se, inclusivamente, ultrapassar por outras distribuidoras entretanto formadas e a lista de filmes importantes que não exibiu nos seus cinemas inclui obras como Ne Change Rien, Les Plages de Agnès, Entre les Murs, Tony Manero, Wendy and Lucy, Uncle Boonmee… e 36 Vues du Pic Saint Loup, para citar apenas os mais importantes. Nem filmes portugueses como a estreia de João Nicolau nas longas ou o último de Alberto Seixas Santos, noutros tempos coutadas de Paulo Branco, por lá passaram. Adicionalmente, com os buracos que criou nos multiplexes do Estádio de Alvalade e do Freeport de de Alcochete a juntar à exibição de blockbusters, mostram que de cada vez que o produtor e distribuidor sucumbiu ao gigantismo, a coisa não correu muito bem. Pelo contrário, se alguma coisa os “sucessos” recentes de Lola, Les Herbes Folles e Des Hommes et des Dieux mostram é que um peixe de aquário, se quiser competir com um tubarão, tem de o fazer num desporto diferente, o da qualidade, da imaginação na programação e da exclusividade. Também não ajuda o lado desconfortável das salas de Paulo Branco, sobretudo quando comparado com o novo e arejado CinemaCity Classic de Alvalade, esse sim a tentar cativar audiência com filmes exclusivos e um design moderno e confortável. Paulo Branco atirou-se de cabeça numa guerra desigual e aparenta estar a perder a toda a linha. Afinal de contas, da primeira vez que fui ao King, estava em exibição um filme de Sharunas Bartas…

Pode ser, então, que saia algo de bom deste encerramento. Que o tempo volte a ser de militância, de critério nas escolhas e de tentativas, para lá do muito útil Medeia Card, de dinamização dos espaços que permanecem. Que os erros sirvam de aprendizagem e que a cinéfilia em Lisboa toque a rebate e se reforce, com uma sala de reposição e, insisto, outra de exclusivo para o cinema oriental. E também pode ser que o Roberto se torne num bom guarda-redes…

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