A edição em dvd de The Narrow Margin (1952) de Richard
Fleischer mostra o quanto, mercê dos turcos da Cahiers du Cinéma, o estatuto do
film noir se alterou desde a feitura dos filmes. De séries-b feitas com o
minimo de meios possíveis para mostrar em double-bills que potenciassem um
espectáculo barato e que durasse um serão inteiro aos espectadores, saem hoje
edições dvd cuidadas, com comentários audio e com transcrições de imagem e som
imaculadas, dignas de coleccionistas criteriosos. O filme, diga-se desde já,
merece amplamente esse estatuto, ao ser exemplificativo de muitas das melhores
técnicas e tendências do noir série-b. História de um detective que tem de
levar a viúva de um mafioso de comboio de Chicago a Los Angeles para
testemunhar em tribunal enquanto a protege dos antigos comparsas do marido,
prontos a matá-la, é também um belo exemplo do thriller de comboio, que
aproveita toda a claustrófobia e a exiguidade espacial de um comboio, bem como
a inevitabilidade do fim da viagem para potenciar a tensão no espectador.
Claro, curto e consiso (72 minutos de duração), como os melhores exemplos do
género, é um filme sempre em movimento, deslocando-se constantemente entre as
diferentes partes do comboio e que aposta num interessante jogo com o exterior,
não só continuando durante as paragens da viagem o mesmo jogo de gato e de rato
que tem lugar dentro do comboio, como também interagindo com o que é visto pela janela.
Metodicamente realista, é um filme sem música, que utiliza os sons e o
constante jogo de luz e sombra para dar a sensação de movimento do comboio que
poderia faltar aos cenários de estúdio. No geral, é um belíssimo filme,
emocionante até ao fim e que aproveita da melhor forma as vantagens de uma
equipa rotinada e de actores habituados a estas personagens-tipo, pouco
trabalhadas mas credíveis (destaque para Charles McGraw, actor em Spartacus e The Birds, entre outros) para nos dar uma obra ultra-eficiente e
que não perde nunca de vista a criação de uma tensão quase palpável no
espectador.
1 comentário:
Adoro este filme. É um exemplo que se pode encontrar grande cinema sem haver estrelas por perto.
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