Nos Estudos Culturais, dá-se o nome de “outrização” ao processo que consiste em criar uma entidade de oposição, um ser com caracteristicas específicas mais ou menos estereotipadas, para lá do seu caracter pessoal e independente enquanto ser humano, que tanto pode ser motivo de medo como foco de discriminação. É sobre este processo, de quatro ou cinco maneiras diferentes, que se debruça Venus Noire, quarto filme de Abdellatif Kechiche, actualmente em exibição nas salas portuguesas.
Contando a história de Sartjes Baartman, mulher pertencente à etnia hotentote que é trazida para a Europa do século XIX e aí utilizada, sucessivamente numa gradação que constitui a narrativa do filme, em espectaculos circenses em Londres, como atração exótica em salões parisienses, como motivo de estudo para cientistas interessados em provar a superioridade da raça branca e, finalmente, como atracção maior num bordel, é um filme que percorre os mesmos caminhos estéticos dos filmes anteriores, apenas expandindo o seu escopo. De câmara digital naturalista, acompanhando as suas personagens de muito perto e seguindo os seus movimentos em panorâmicas rápidas, passa dos subúrbios de Marselha que compunham o seu universo para se focar numa narrativa circular que percorre a Europa oitocentista com pleno engenho na criação de ambientes e no estabelecimento de cenários, bem como com precisão na reconstituição de época.
Ninguém disse que era filme fácil e a recepção no Festival de Veneza em 2010, onde foi vaiado, demonstra-o plenamente. Porém, coloca-se a questão: tinha de ser assim tão difícil? É que Venus Noire, com as suas duas horas e meia de duração, demonstra-se sempre algo exagerado no tom e na forma de expor as desventuras da sua heroína, como se, num fenónemo de catarse forçada, o espectador fosse obrigado a expiar pela sua visão do filme as desventuras da sua heroína. Semelhante factor torna o filme numa experiência cansativa e que poderia ter sido feita sem alienar o seu próprio espectador, que a páginas tantas não tem alternativa senão pensar que o filme perdura muito para lá da sua demonstração do que é o Outro.
De referir também que há, no genérico final, uma compilação de imagens do regresso dos restos mortais da “venus hotentote” à sua África do Sul natal, que redunda num posicionamento que me parece “incorrecto” por parte do cineasta: Venus Noire ganha muito mais força, nos seus melhores momentos, quando se propõe a explanar a sua ideia central do que visto, à luz destas imagens, como mera biografia da sua personagem principal. Assim, é um filme que, apesar da força do seu assunto, se acaba por auto-limitar bastante em termos de propósito.
Contando a história de Sartjes Baartman, mulher pertencente à etnia hotentote que é trazida para a Europa do século XIX e aí utilizada, sucessivamente numa gradação que constitui a narrativa do filme, em espectaculos circenses em Londres, como atração exótica em salões parisienses, como motivo de estudo para cientistas interessados em provar a superioridade da raça branca e, finalmente, como atracção maior num bordel, é um filme que percorre os mesmos caminhos estéticos dos filmes anteriores, apenas expandindo o seu escopo. De câmara digital naturalista, acompanhando as suas personagens de muito perto e seguindo os seus movimentos em panorâmicas rápidas, passa dos subúrbios de Marselha que compunham o seu universo para se focar numa narrativa circular que percorre a Europa oitocentista com pleno engenho na criação de ambientes e no estabelecimento de cenários, bem como com precisão na reconstituição de época.
Ninguém disse que era filme fácil e a recepção no Festival de Veneza em 2010, onde foi vaiado, demonstra-o plenamente. Porém, coloca-se a questão: tinha de ser assim tão difícil? É que Venus Noire, com as suas duas horas e meia de duração, demonstra-se sempre algo exagerado no tom e na forma de expor as desventuras da sua heroína, como se, num fenónemo de catarse forçada, o espectador fosse obrigado a expiar pela sua visão do filme as desventuras da sua heroína. Semelhante factor torna o filme numa experiência cansativa e que poderia ter sido feita sem alienar o seu próprio espectador, que a páginas tantas não tem alternativa senão pensar que o filme perdura muito para lá da sua demonstração do que é o Outro.
De referir também que há, no genérico final, uma compilação de imagens do regresso dos restos mortais da “venus hotentote” à sua África do Sul natal, que redunda num posicionamento que me parece “incorrecto” por parte do cineasta: Venus Noire ganha muito mais força, nos seus melhores momentos, quando se propõe a explanar a sua ideia central do que visto, à luz destas imagens, como mera biografia da sua personagem principal. Assim, é um filme que, apesar da força do seu assunto, se acaba por auto-limitar bastante em termos de propósito.
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